terça-feira, 11 de junho de 2013

Pela articulação e fomento da criação artística em Sintra

JOÃO DE MELLO ALVIM

Quem conheceu a criação artística em Sintra há vinte anos, e conhece a actual, encontra diferenças assinaláveis, desde logo na quantidade de intervenientes, assim como de projectos e de público(s). Há vinte anos, na área de oferta artística, havia dois protagonistas e públicos bem definidos (dentro do que é possível definir “público”): a Câmara e as Sociedades Recreativas. O evento emblemático daquela era (e continua a ser) o Festival de Sintra dirigido a um público iniciado, maioritariamente vindo de fora de Sintra, enquanto as iniciativas das colectividades se dirigiam (e ainda se dirigem) ao público local. A sazonalidade era (é) uma característica comum.

Actualmente, a oferta das várias disciplinas artísticas aumentou exponencialmente, tornou-se mais regular e mais abrangente quanto aos públicos. Câmara e colectividades já não são os únicos núcleos dinamizadores, novas estruturas de criação, espaços e criadores individuais, são testemunho de uma vitalidade então desconhecida. Sintra deixou de ser só paisagem natural e paisagem edificada.

No entanto, uma contradição que se começou a desenhar com o advento de novos protagonistas culturais, nunca foi resolvida: refiro-me à relação destes com o poder autárquico. Efectivamente o Pelouro da Cultura cresceu (mais) em número de pessoas e (menos em) orçamento, mas a conexidade entre a iniciativa municipal e a privada, oscilou (oscila) entre a desconfiança e o apoio desarticulado. Pelo meio há um misto de indiferença e tolerância paternalista.

Para mim, a questão central para um potente impulso da actividade artística e cultural em Sintra, e por consequência, para uma nova e desempoeirada política cultural, não está no lançamento de novas iniciativas com objectivos sólidos, inovadores e com projecção nacional e internacional, porque elas já existem, tanto com a chancela municipal como privada. A questão está na articulação catalisadora e no fomento do que já existe, assim como no desmontar (mais: no desactivar!) do complexo de que só o que tem a chancela da Câmara é importante, tanto na divulgação, como ainda na constituição das equipas (geralmente recrutadas ao sabor de interesses instalados), como, por consequência, no orçamento. Mais: o responsável pelo Pelouro da Cultura deve ter visão estratégica (a Cultura não é só a criação artística, mas também o património, a museologia, etc), e peso político para estimular esta articulação (que se deve estender a outros Pelouros), corrigindo as, por vezes, escandalosas assimetrias orçamentais, e enfrentando “as castas” instaladas no aparelho municipal.

Em forma de anedota, a questão está espelhada nas dezenas de sinalizações que estão semeadas por todas as entradas de Sintra, indicando o(s) caminho(s) para o Olga Cadaval; por outro lado, os outros espaços onde se desenvolvem actividades culturais de iniciativa privada, têm uma única placa a sinalizar, que fica quase em cima do edifício…


João de Mello Alvim. 1952.Vila Nova de Gaia. Actualmente espoliado como professor aposentado. Ex-jornalista cultural, DN e TSF. Co-fundador e Director Artístico do Chão de Oliva. Adepto, não fanático, do FCPorto.

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