quarta-feira, 17 de julho de 2013

O sapato de Cinderela

FREDERICO MARTINS RODRIGUES


Psicólogo da Noite e de estados de alma liquefeitos, teimosamente patrulhando uma nublada solidez





-Quando é que descobriste? Qual foi o momento em que passaste a olhar-me assim, com esses olhos?

-Lembras-te de quando elogiaste o meu café em frente de toda a gente?

-Sim...

-Disseste que além do sabor, continha um bocado daquela beleza que marcava tudo o que eu tocava, tudo o que fazia, como se eu fosse a essência da beleza e andasse a distribuí-la pelas coisas e pessoas...

-"Tornando tudo um pouco mais colorido e elegante aos meus olhos... Um simples café fez-me aperceber o quão feliz eu fico ao sentir que pertenço a uma parte do mundo que ela transforma!" por acaso devo admitir que estava um tanto inspirado nesse momento...

-Mas não foi só a frase que me fez acordar, foi o facto de a dizeres sem tirares os olhos de mim... Ias articulando as palavras enquanto percorrias os olhos por cada milímetro da minha cara, como se definisses uma paisagem à medida que ela te aparecia no campo de visão... Aí percebi que te era inata essa capacidade de criar harmonia entre as coisas e a beleza das palavras que as definem...

-Daí apaixonar-me pela beleza em si... Se soubesses o quão difícil é conviver com o que passamos a vida a tentar descrever, sabendo nunca chegar ás palavras realmente dignas de tal esforço, por não as haver...

-Então não confies nas palavras, deixa os teus olhos falarem por ti... Porque se dizes que eles vêem a beleza, eu digo-te que eles a reflectem na perfeição...

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