segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

País adiado

EURICO LEOTE


O que é adiado? É aquilo que se anseia alcançar, e apesar de todos os esforços e desejos não se almeja. E não se almeja porque não depende de cada um de nós isoladamente, mas exige percorrer um caminho lado a lado, exige um contributo colectivo e livre, límpido e puro.

Num país ou numa sociedade tudo é socialmente adiado. Adiado porque protelado. Adiado porque justificado sem justificação alguma. Protelado porque são esses os objectivos de quem protela, de quem arrasta no tempo as decisões, com argumentos fúteis e balofos. Adiado e protelado porque é nesse sentido que toda a política social e de distribuição da riqueza funciona e caminha.

Arrastado no tempo porque é a única forma de continuar a governar e mandar, com base nas sucessíveis promessas não cumpridas, que constituíram o cerne de toda a questão a adiar. E quando se adia, tal é feito com o argumento de que se trabalha para o bem comum e colectivo. Que esses são os desígnios nacionais, e que os mesmos contribuem para o bem estar social do povo, e que são necessários ao equilíbrio financeiro das contas do país.

Adia-se porque adiar faz parte da tradição histórica e cultural do país. Protela-se para que tenhamos sempre quem nos venha lamber as mãos, quando não as botas. Arrasta-se porque é a única forma de se manterem as pessoas humildes e submissas, esperançosas na alteração, nas mudanças, no finalmente, numas migalhas sempre bem vindas e melhores do que coisa nenhuma.

O meu país é um país adiado, porque adiadas são as esperanças, as verdadeiras reformas sociais, o bem estar físico e social, o futuro, as gerações vindouras.

O meu país sempre foi um país adiado, com fortes índices de pobreza social e cultural. Com fortes taxas de analfabetismo e de emigração.

O meu país por momentos parou, reflectiu e repensou, mas passados os primeiros deslumbramentos voltou a ser um país adiado. As promessas esvaíram-se. A emigração regressou, e com ela o desemprego e a miséria.

O meu país voltou a ser um país adiado, na cultura, na educação, na saúde. Mesmo para os que arrastam e mantêm esse adiamento. Porque continuam a ser iguais a si próprios, na sua pequenez e no seu não fazer. Continuam a arrastar o meu país, contribuindo para que o mesmo cada vez seja mais adiado.

Nem se apercebem que eles próprios são peças adiadas que fazem parte deste mesmo país social e culturalmente adiado.

O meu país é um país adiado, adiado e esperado, por vezes desesperado, porque esperam os deficientes, os invisuais, os velhos e os novos, os desempregados e os com emprego, os enfermeiros e os professores, os comerciantes e os pescadores, os transportes e os agricultores, os médicos e os solicitadores, e os militares.

Todos esperam e desesperam, menos os políticos, pois deles nada se espera, logo não são esperados. Esses bem que podiam ser adiados e protelados, e nas prateleiras arrumados. Arrumados porque antiquados, porque desajustados. Arrumados porque fora de tempo, descontextualizados. Esses podiam ser eternamente adiados. O povo agradecia, e só dessa forma deixaria de ser adiado.

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